sábado, 19 de novembro de 2016

Ensaio sobre a Bondade

Sobre a Bondade





O que é ser bom? Entre tantos conceitos espalhados e retorcidos da modernidade a bondade se encontra como um dos que tiveram sua significação praticamente esvaziada. Difícil encontrar uma definição específica entre tantas. Uma breve pesquisa no dicionário revela o seguinte: bondade s.f 1 qualidade de bom 2 ação que reflete tal atributo 3 cortesia; favor. Procurei refletir sobre esta última definição, favor. É a bondade em si uma troca de favores, um escambo material? Sobre a primeira pensei: o que é ser bom? É fácil julgar uma pessoa como boa? Pode a Bondade ser um Imperativo Moral? Estas e algumas outras questões serão abordadas ao longo deste simples ensaio.

O mundo contemporâneo apresenta uma triste sina dos novos tempos: a impossibilidade de definição dos valores. Muitos são os conceitos sobre todos os tipos de assunto, não existe um consenso, há sempre uma problematização em cima de outra, isso nos traz à ideia de complexidade. A complexidade procura expandir o conhecimento, analisá-lo sob vários enfoques, porém sem preocupação com a qualidade das ideias apresentadas (isto é um ponto de vista meu e bem passível de refutação), não há profundidade na complexidade, há somente expansão, sem existir um aprofundamento real, que seria, segundo uma teoria (e apenas isso) a capacidade de dizer coisas essenciais em poucas palavras.

Apesar de todo este problema, podemos definir a Bondade como a capacidade metafísica que tem o homem de reconhecer no outro uma unidade, algo que é parte dele, um lampejo de intuição que o faz reconhecer o Uno em meio à multiplicidade da matéria. A bondade é, assim, um sentimento inato ao homem que viria ao mundo com um esquema, uma espécie de esqueleto mental que o predispunha para o sentimento de Bondade. Marc Hauser defende esta ideia, e Rousseau acreditava também na bondade humana como particularidade inata do ser. Sendo assim, podemos definir Bondade como atributo do espírito humano.

Infelizmente, atualmente algumas pessoas menosprezam a bondade, procuram tratá-la como característica ou predicado da fragilidade. Pessoas bondosas são consideradas tímidas, que não sabem dizer não, que deixam que se cometa qualquer tipo de injustiça contra elas. Pessoas bondosas, ou mais conhecidas como boazinhas, são pisoteadas pelo esquema do mais forte que vê nelas indivíduos fracos e débeis. Porém, este é um conceito extremamente equivocado. Isto nunca foi bondade e ela não pode ser reconhecida como uma fragilidade ou passividade, pois bondade é particularidade de uma alma fortalecida e ativa, em movimento constante. Isto nos leva à primeira pergunta: o que é ser bom?

Muitos confundem Bondade com Assistencialismo. Contudo, não estou aqui em posição de julgar qualquer coisa, cada qual possui seu mérito, porém, um atua nas causas de determinados problemas e o outro em seus efeitos. Porém, todos os meios são válidos e essenciais. Quando digo que o homem é bondoso, digo que ele age sobre as causas dos problemas humanos essenciais como, por exemplo, luta por uma política não classista, menos excludente, que priorize o sentimento de dignidade humana, que busque um sistema que avalie não apenas aspectos materiais, mais psicológicos e espirituais. Um homem bondoso atua sobre os problemas e encontra soluções, age sobre o mundo, e muda o curso da história. Mas é fácil reconhecer um homem bom?

Para responder, vamos começar com uma pergunta: O que é mais fácil de enxergar, a bondade ou a beleza? A resposta é bem simples, a menos que você seja uma pessoa incomum e possa reconhecer em um homem a bondade de supetão. A beleza em termos superficiais é mais perceptível do que a bondade, ela (a bondade) só pode ser dada como particularidade de alguém se houver convivência com a pessoa, logo, é impossível enxergar a bondade de imediato, é necessário trocas, testes, enfrentamentos, laços. O curioso é que quando você enxerga em alguém a verdadeira beleza, o que chamo de Beleza em Profundidade, é impossível não enxergar na pessoa também a bondade.

Podemos visualizar também uma pessoa bondosa por seus atos. É aquela famosa frase: “conhecemos a árvore por seus frutos”, penso que o homem bondoso não diz que é bom ele simplesmente é. Um homem bondoso não diz, ele age, e mostra o amor como ação sem se preocupar com reconhecimento ou trocas, pois o amor não é um comércio.

Bondade como Imperativo Moral

Immanuel Kant, o gago, considerava a bondade como a lei irrevogável, um sentimento que deveria fazer parte do esquema de vida do ser humano, sem bondade o homem não seria livre e ele (o homem) tem o dever de ser bom, sob pena de nunca chocar-se com a vida o suficiente a ponto de deixar nela sua marca. “Age de tal maneira que o motivo que o levou a agir possa ser convertido em lei universal”, este é o famoso imperativo categórico. Penso que tais ações apregoadas pelo famoso filósofo e exímio jogador de bilhar estejam ligadas à questão da bondade, basta uma nobre ação para ela espargir-se por todos os cantos, tornar-se uma Lei. Ainda segundo Kant, o homem que agia moralmente por dever era tão especial que não poderia haver no mundo nada superior a ele.

Alguns podem dizer: é o homem bom porque assim satisfaz seus interesses, logo não existe bondade, mas apenas compensação. Contudo, não vejo desta forma tão pessimista. O homem é bom com seus pares não para sentir-se superior a eles (isto somente acontece quando não se sente bondade, mas sim falta de amor próprio, como é o caso de algumas pessoas), o homem é bom porque sua natureza é assim. Acredito, como Rousseau, que o homem é bom, e cumpre seu Dharma quando faz da bondade uma postura de vida, o homem livre é aquele que se adéqua à Lei. Se um homem atua por maldade, o faz por ignorância, pois desconsidera a sua própria natureza, que tende para o Bem.

Até mesmo a ciência já fez descobertas interessantes a respeito do que seja a bondade, mas claro que ainda há muito que considerar. Porém, já se sabe que quando observamos uma pessoa agindo de forma positiva para com outras pessoas, algumas áreas do cérebro são ativadas, as mesmas áreas que são ativadas por aquela pessoa que praticou uma boa ação. São os chamados neurônios-espelho, praticamos certas ações mentalmente, como, por exemplo, quando observamos alguém abrir uma latinha de refrigerante, imediatamente o barulhinho provocado pelo abrir da latinha ativa em nós a mesma sensação, mas em nosso campo mental. Assim, quando visualizamos uma ação nobre a vivemos também em nosso campo mental, e temos uma sensação agradável, uma sensação boa de paz.

Antes de escrever este artigo considerei também a natureza do mal, não podemos desconsiderá-lo, porém, o mal nada mais é do que “ausência de bondade”, assim quando não há luz há trevas, quando não há bondade há vileza, porém, basta uma pequena chama para acender todas as velas de que dispomos. O mal existe? De alguma forma sim, mas existe algo para além do bem e do mal, algo superior à bondade, algo que existe apenas NO SEGREDO PARTICULAR DE CADA CORAÇÃO. Cabe a cada um descobrir qual sua resposta no mais profundo inconsciente, em cada ínfimo detalhe da vida, pois como diria Cristo: “O reino de Deus esta dentro de você e ao seu redor, não em casas de pedra e madeira, lasque uma madeira e me encontrará, erga uma pedra e estarei lá”.

Salam Amigos.

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