domingo, 15 de novembro de 2015

Ciência usa biologia sintética para criar máquinas orgânicas


Em um laboratório de um grande centro de pesquisas, cientistas modificam o DNA de um parasita. Em vez de causar uma doença grave, ele passa a ser o tratamento para uma outra doença. Dito assim, parece roteiro de ficção científica. Mas essa realidade já está bem próxima de nós.
Essa pesquisa está sendo desenvolvida agora pela equipe iGEM/UFMG, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O parasita em questão é a leishmânia, causadora da leishmaniose – doença que pode levar à morte. O objetivo do trabalho é modificar o DNA desse parasita para que, em vez de causar a doença, ele possa ser um medicamento para a artrite reumatoide.
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Equipe afinada. A professora Liza Felicori (terceira da esq. para dir.) analisa culturas no 


“Nossa ideia é ousada. Sabemos que a leishmânia infecta os macrófagos, células que estão envolvidas nos processos inflamatórios. Nosso objetivo é modificar essa leishmânia para que ela morra assim que entrar na célula, sem chegar a causar a doença. Além disso, vamos inserir nela um gene para que ela passe a produzir o interferon, um anti-inflamatório. Assim, quando entrar no organismo, essa leishmânia modificada irá direto para as células envolvidas nos processos inflamatórios e morrerá, mas vai liberar o medicamento, tratando a artrite reumatoide”, explica a professora de bioquímica Liza Felicori, coordenadora da equipe iGEM/UFMG e responsável pela pesquisa.
O objetivo dessa nova forma de tratamento é aumentar a eficiência do medicamento e, ao mesmo tempo, diminuir os efeitos colaterais. A professora espera que o medicamento esteja disponível no mercado a partir de 2030.
Tecnologia. Para conseguir o objetivo pretendido, a equipe usará as técnicas da biologia sintética. “Essa é uma área nova da ciência, em que tentamos modificar o metabolismo de um microrganismo para que ele produza um produto de interesse, como uma droga ou um biocombustível”, conta a professora.
A insulina hoje usada pelos diabéticos já é produzida por uma bactéria geneticamente modificada. Em São Paulo, uma equipe estuda a produção de etanol por leveduras, e equipes pelo mundo já conseguiram modificar uma bactéria para que ela produza a artemisina, uma medicação contra a malária.
Uma das principais vantagens dessa nova forma de produção de substâncias é a viabilidade econômica. O etanol produzido por bactérias, por exemplo, custará muito menos do que o feito a partir de cana-de-açúcar, pois dispensará toda a parte agrícola. Vale o mesmo para a artemisina, substância naturalmente produzida por uma planta. “A extração é difícil, e o rendimento é baixo. Com as bactérias, conseguimos uma produção maior”, diz Liza. “O caro é chegar até a forma final do microrganismo. O produto sai bem mais barato”, completa ela.

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