sexta-feira, 20 de julho de 2012

Amar é ... e o desejo de amar

O que nos mantém unidos





Com enorme esforço e precisão matemática, pesquisadores que estudam o relacionamento de casais tentam desvendar os complexos mecanismos que regem o amor e entendem, cada vez melhor, porque algumas uniões duram décadas, enquanto outras estão de antemão, condenadas ao fracasso


Harald Martenstein



John Huck
Tanto faz se é com a escova dental ou a máscara de mergulho, Nabiha Dahhan e Thomas Kolodziej documentam sua vida a dois em fotos instantâneas e assim transformam o narcisismo juvenil em objeto de arte (Título: "Harmonia"). Pesquisadores de casais elogiariam: aqui se demonstra o desejo pela união
Um pequeno apartamento em Seattle, nos Estados Unidos. Um casal está à mesa, tomando o café da manhã. Ambos têm cerca de 40 anos. Nós os chamaremos de Paula e Fred. Paula prepara uma torrada para si e olha pela janela. Fred folheia o jornal. Os dois usam microfones nas camisas e sensores no corpo. Nas paredes do apartamento foram instaladas três câmeras de vídeo. O casal faz seu desjejum no "laboratório do amor", do professor de Psicologia John Gottman.
Suas instalações estão localizadas no campus da universidade em Seattle, e dispõem de cozinha, copa, um banheiro confortável e um quarto. Cientistas, técnicos e estudantes acompanham em monitores todos os gestos e movimentos de Paula e Fred. Através de alto-falantes, os pesquisadores escutam cada palavra trocada entre dois, enquanto os sensores registram constantemente suas frequências cardíacas e a resistência de sua pele; transmissores de sinais de estresse ou descontração.
Gottman observa casais desse modo há mais de 20 anos, e alguns milhares já serviram como casos de referência, permitindo que sua vida a dois fosse investigada. No laboratório eles devem se comportar como se estivessem em casa. Somente no banheiro e na cama eles não são observados.
A mímica dos voluntários é desvendada em questão de segundos: a raiva, por exemplo, se reflete nas sobrancelhas, que descem simultaneamente, na pálpebra inferior tensionada e nos lábios que se comprimem. O desprezo repuxa o canto esquerdo da boca para cima; em momentos de tristeza, a testa se franze entre as sobrancelhas. Essas manifestações não verbais são consideradas particularmente reveladoras, porque as pessoas praticamente não têm como controlá-las.
Ao todo, os pesquisadores de Seattle conceituam dez complexos sentimentais negativos e cinco positivos: além da raiva, do desprezo e da tristeza, contam demonstrações de poder, atitudes defensivas, medo, dominância, repulsa (ou alheamento), queixas e "alicerces", como concordância, humor, alegria, dedicação e interesse.
O californiano John Huck fotografou 70 casais para um projeto de arte. Muitos deles são surpreendentemente parecidos. Pesquisadores presumem que isso provavelmente ocorre porque as pessoas reagem positivamente a rostos parecidos aos seus.
Porém, frequentemente, os modelos de Huck tinham uma tendência à inconstância, razão pela qual o fotógrafo também entende seu trabalho como uma reflexão irônica
sobre a meia vida útil do eterno amor


OS CONFLITOS entre os parceiros também são codificados: quantos segundos dura uma briga, com que frequência uma discussão escala patamar mais agressivo, quem cede e quem contemporiza mais vezes? Por fim, os pesquisadores ainda avaliam os dados colhidos pelos sensores corporais. Com base nessas informações, Gottman elabora estatísticas para cada casal. Por exemplo: 37 críticas de Paula em 10min, 4 manifestações de desprezo e 1 demonstração de poder de Fred, na qual seus batimentos cardíacos saltaram de 88 para 120.
Com essas informações, o computador produz o diagrama de duas equações matemáticas, das quais Gottman extrai os pontos de equilíbrio da relação: nos pontos onde as curvas sempre se cruzam localiza-se o cerne de um determinado relacionamento, ora na esfera vermelha de infindáveis conflitos, ora na zona tranquila de carinhosa dedicação.
O pesquisador, de 68 anos, está convencido de que sua "geometria dos sentimentos" capta a essência da vida a dois: "Só tenho que observar um casal durante 5min para poder dizer se os dois irão se divorciar ou não". Dizem que a quota de acertos de suas previsões atinge fenomenais 91%.
Será que o estado de nossos relacionamentos de fato é tão transparente assim? O amor funciona com regularidade matemática? O segredo da convivência harmoniosa de um casal teria sido finalmente desvendado em laboratório?
A maioria dos estudiosos não arrisca ir tão longe. Mas quase nenhum deles duvida de que todos os relacionamentos são governados por um conjunto de leis essenciais. Essas regras revelam, por exemplo, que tipo de comportamento dialogal arruína uma convivência; elas preveem com precisão os pontos de crise de um amor, e indicam por que parceiros felizes têm vidas mais longas.






John Huck
JÁ FAZ TEMPO que a pesquisa de casais se emancipou, tornando-se um dos maiores campos da Psicologia. Em 1995, durante uma meta-análise superposta, os americanos Benjamin Karney e Thomas Bradbury integraram os resultados de 115 avaliações de longo prazo feitas anteriormente. Elas analisavam, exclusivamente, o que motivava bons casamentos, ou seja, as condicionantes das uniões que haviam se revelado bem-sucedidas. Nos estudos os pesquisadores tinham acumulado dados de 45.000 casais, examinado mais de 200 possíveis fatores de influência e sugerido 900 mecanismos de efeitos diferentes.
Hoje em dia, relacionamentos entre casais são mais delicados do que nunca. A ideia do amor romântico só vem se impondo há três séculos, e é um conceito complicado: o parceiro precisa ser mais que apenas um companheiro de trabalho razoavelmente confiável, que se aprende a conhecer, e às vezes a amar, com o tempo.
No mundo atual, ele ou ela têm de proporcionar tudo ao mesmo tempo: profunda compreensão, sexo apaixonado, aceitação consumada. O parceiro tem de fornecer apoio em momentos de crise, trazer "diversão" no cotidiano, se encaixar perfeitamente no planejamento da vida, e ser "apresentável". Ele também deve oferecer "possibilidades de crescimento", ser fiel, dar espaço ao outro e proporcionar solidez. Mais que tudo, porém, ele tem que suprir felicidade universal. Pois, conviver como um casal é a meta de vida mais importante para quase todas as pessoas, muito mais que o sucesso profissional ou a constituição de uma família.
Em sua busca pelas regras do amor, os pesquisadores exploraram principalmente quatro grandes perguntas:
1. Como nasce um relacionamento, que fatores determinam nossa escolha de um parceiro?
2. Temos um determinado estilo de união, que adquirimos na infância?
3. No que reside o segredo de comunicação entre dois parceiros?
4. Existe algo como um programa de felicidade para uma parceria feliz? As descobertas da pesquisa de casais podem nos ajudar a alcançar o sucesso no relacionamento a dois?





John Huck
"Como seria minha vida se tivesse aparecido outro?" A fotógrafa tcheca Dita Pepe posa ao lado de diversos homens e se imagina em mundos de relacionamentos estranhos
1. A ESCOLHA DO PARCEIRO
Justamente essa primeira fase da formação de um casal, o êxtase da paixão, é muito difícil de ser compreendida meramente através da inteligência científica. O porquê de duas pessoas se escolherem "frequentemente escapa a uma lógica clara", afirma o renomado psicólogo social nova-iorquino Art Aron. Mas quando já estamos apaixonados, nos ocorrem muitas boas razões em favor do parceiro.
Por exemplo, o sexo. Mas este é muito menos um desencadeador dos grandes sentimentos do que uma consequência deles. Afinal, a conclusão após uma noite juntos pode perfeitamente ser: excitante - mas sem "frios na barriga".
A antropóloga Helen Fisher, autora da obra Anatomia do Amor (Editora Eureka, 1995), presume que o impulso sexual na realidade só existe para que o ser humano procure parceiros. O sentir-se apaixonado, por outro lado, possibilitaria fixar-se com um determinado indivíduo. De acordo com ela, o amor une duas pessoas emocionalmente, o tempo suficiente para aumentar as chances de sobrevivência dos descendentes.
PARA COMEÇAR, é provável que as possibilidades iniciais de estabelecer qualquer tipo de relacionamento sejam maiores com alguém parecido conosco. De fato, a semelhança parece desempenhar um papel importante na escolha do companheiro: é possível designar com grande precisão os pares "certos" em um grupo de pessoas desconhecidas, quando elas se parecem fisicamente. Na Escócia, cientistas constataram que, ao serem confrontadas com uma série de fotografias de homens, as mulheres sempre se sentiam mais atraídas por elas mesmas - antes do teste, os cientistas tinham convertido digitalmente as fotos dessas mulheres em rostos de homens.
No momento decisivo, porém, é provável que um elemento mais trivial que a aparência pese na decisão. "Embora tenhamos que achar alguém atraente para nos apaixonar, muitas vezes depende das circunstâncias se esse relacionamento realmente funcionará", diz Art Aron.
Uma pesquisa realizada pelo psicólogo social com mais de 1.000 enamorados revelou: de cada 10, em média 2 já se conheciam muito tempo antes de se apaixonar. Em todos os casos, o fator decisivo foi a súbita sensação de ser particularmente apreciado por aquela pessoa. Segundo Aron: "Ser notado por alguém, ou até mesmo só imaginar isso, é um afrodisíaco potente".


John Huck

DUAS PESSOAS QUE SE APROXIMAM, logo começam a trocar recompensas: eles cozinham um para o outro, se cobrem de atenções, fazem passeios juntos, e falam de suas preferências e aversões. Essa "autorrevelação" é considerada um dos laços de união mais poderosos da vida a dois, pelo menos no início, quando o outro é arrebatado em seu próprio mundo interior.
Aron conseguiu comprovar uma lei bastante estranha dessa força de atração em uma experiência um tanto excêntrica, que chamou de "experimento da ponte": uma mulher atraente conduz uma pesquisa irrelevante entre transeuntes masculinos. Ora ela ficava em pé sobre uma ponte fixa, ora em uma estreita e oscilante ponte pênsil. E ela sempre fornecia aos homens o seu número de telefone, caso tivessem interesse em saber o resultado da enquete.
De fato, alguns homens usaram essa desculpa para retomar o contato com ela. Mas os que a viram na ponte pênsil telefonaram quatro vezes mais.
A oscilação da ponte havia intensificado seu emocional físico, uma reação típica a tudo o que causa medo, está ligado ao estresse, ou simplesmente é empolgante. Em vista disso, o cérebro havia procurado uma possível causa, encontrando duas possibilidades: a ponte ou a mulher. Mas quando a situação é tão ambígua, pode haver conclusões equivocadas. O motivo da agitação interna é creditado à mulher: o que faz com que ela, subitamente, pareça ser muito mais atraente do que em condições normais.
OS PESQUISADORES chamam essa confusão de sentimentos, que fica posteriormente registrada na memória, de "transferência de emoção". E, de acordo com Aron, até 15% de todas as histórias de amor começam assim.
Mas, invariavelmente, segue-se o desencantamento, a moderação. "Do mesmo modo como é impossível ter uma vida plenamente satisfeita quando se está constantemente embriagado, também não se pode estar permanentemente apaixonado", compara Thomas Lewis, formulador da Teoria Geral do Amor. O sexo é logo prejudicado. Até em casais satisfeitos, a chamada "frequência de coito" cai para 50% após cerca de um ano e meio, quando comparada ao êxtase amoroso das primeiras semanas.



John Huck
Em seu estudo A Família, o britânico Zed Nelson documentou como evoluímos e envelhecemos juntos. Ele começou seu trabalho quando a mulher de um amigo engravidou. Desde então, ele fotografa a família ano após ano, sempre diante de um pano de fundo neutro e com a mesma luminosidade


COMO O SEXO, também a satisfação perde intensidade. Em um estudo representativo da Universidade de Bamberg, na Alemanha, que envolveu mais de 1.500 casais, 70% dos parceiros estavam "muito satisfeitos" no início de seu casamento, mas após seis anos, pouco menos da metade ainda sentia a mesma coisa.
Quando isso acontece, a maioria dos casais não mergulha logo em uma crise séria; eles ainda sentem sua parceria como sendo positiva só que em um nível mais baixo. Mas calcula-se que 30% de todos os relacionamentos sejam uniões de risco, com uma grande probabilidade de separação.
2. O ESTILO DO VÍNCULO
Será que existem pessoas, cuja personalidade simplesmente não foi criada para manter um bom relacionamento? Ou que nunca aprenderam o que é um carinho confiável na infância e na adolescência?
A teoria mais famosa sobre o comportamento de relações é a chamada Teoria do Vínculo. Esta parte do princípio que toda pessoa segue preponderantemente um de três "estilos de união": o seguro, o distanciado-hesitante, ou o medroso-ambivalente.
Com o passar do tempo, todos nós elaboramos "modelos de amor" cognitivos, nos quais armazenamos as experiências acumuladas em nossa vida de relacionamentos: como era o vínculo com nossos pais na mais tenra infância, como vivenciamos amizades e amores passados. E, de acordo com a teoria, é com essa bagagem, cheia de noções de união, que começamos todo novo relacionamento.
O estilo seguro é muito frequente. As pessoas que o seguem falam mais o menos o seguinte sobre si mesmas: "Tenho facilidade para estabelecer contato com os outros. Acho que sou bastante simpático(a). As outras pessoas em geral são amáveis. Consigo reagir adequadamente conforme a situação. O amor pode ser eterno e por que não?".
Pessoas que são frequentemente rejeitadas suprimem duradouramente sua necessidade de proximidade; elas desenvolvem um estilo distanciado-hesitante e é mais provável que digam o seguinte: "Também me sinto bem sem uma união emotiva. Sou independente e autônoma e não gosto que outros cheguem muito perto de mim. Minimizo meus sentimentos em relação ao outro, mas isso não faz mal, porque o amor romântico não dura muito mesmo".E os indivíduos rejeitados, que con-cluíram não serem amáveis e encantadores, e se esforçam sobremaneira para estabelecer uma proximidade com outros, mas ao mesmo tempo se defendem violentamente contra isso, são considerados do tipo medroso-ambivalente. "Não acho complicado me envolver com os outros, mas não posso confiar neles ou depender deles, tenho medo disso", dizem. "Não sou feliz quando não tenho um relacionamento amoroso, mas o outro em geral não gosta tanto de mim como eu dele. Meus parceiros se queixam frequentemente de que eu os sufoco; que não lhes dou espaço".
Os estilos de união influenciam decisivamente nosso comportamento. Em um experimento, diversos casais foram chamados a se submeter a um pretenso exame. Os "médicos" fizeram o possível para intimidar os voluntários e despertar neles a impressão de que teriam de se submeter a um procedimento doloroso.

OS CASAIS "SEGUROS" se apoiaram mutuamente na sala de espera. Quanto maior era o seu medo, mais esses parceiros se aproximaram um do outro. Os pares "medrosos" exibiram conduta diametralmente oposta: quanto mais medo da intervenção, mais eles se afastavam um do outro. Eles não esperavam nenhuma ajuda do companheiro e também não ofereciam a sua.
Não há dúvida de que as "uniões seguras" têm uma vida amorosa muito mais fácil. O relacionamento entre dois "seguros" dura, em média, 10 anos; o dos "medrosos" apenas a metade desse tempo. Além disso, 25% dos reservados e pouco amados vivem como solteiros, em comparação a apenas 10% dos "seguros".

John Huck

ESSES TRÊS ESTILOS foram confirmados em centenas de estudos, mas a pergunta decisiva permanece em aberto: estamos condenados a manter um determinado tipo de vínculo?
Durante muito tempo, a maioria dos teóricos acreditou que cada estilo é moldado na infância. Mas até agora essa tese não conseguiu ser comprovada empiricamente.
Até um dos grandes mestres da pesquisa de relações íntimas e emoções, o americano Phillip Shaver, passou a se exprimir de forma cautelosa. A correlação entre o estilo de uma pessoa quando criança e depois, quando adulto, "seria, na melhor das hipóteses, muito pequena". Experiências vividas em ligações posteriores podem suplantar os vínculos da infância, porque estamos constantemente reescrevendo nossos modelos de relacionamentos.
É claro que uma pessoa cujos pais carinhosos e atenciosos lhe ensinaram o "bê-á-bá do amor" terá uma vida emocional mais tranquila; uma pessoa "segura" provavelmente continuará tendo experiências amorosas positivas, ou seja, manterá seu estilo. Mas acasos infelizes, golpes do destino, ou simplesmente a força de atração de uma pessoa podem mudar tudo isso. Por exemplo, um "seguro" se apaixona por uma "distanciada-hesitante" e se torna mais inseguro no decorrer do relacionamento. Ou uma "medrosa" encontra um "seguro" e aos poucos aprende que ela pode confiar na afeição dos outros. Portanto, não é exclusivamente com base no modelo do vínculo que nossos relacionamentos fracassam.
Entretanto, independentemente dos estilos de união, toda parceria passa por momentos em que há o perigo de um rompimento: a partir do segundo e até o quarto ano, bem como durante o período em que o primeiro filho atinge a puberdade. Do ponto de vista estatístico, essas são as fases decisivas de perseverança em um relacionamento.
Filhos têm um efeito paradoxal sobre um casal. Eles prolongam a vida a dois, mas pioram sua qualidade. De acordo com as conclusões de um estudo do pesquisador familiar Wassilios Fthenakis, da Universidade de Bolzano, na Itália, não é só o fator "bebê" que sobrecarrega os casais. A forte sensação de dependência mútua também pesa: de repente, os novos pais se veem como um grêmio familiar, um sistema que tem de oferecer conforto e abrigo. Na pesquisa de casais isso é considerado um gravame.
O melhor antídoto contra o desmoronamento do amor parece ser o apoio mútuo (veja o box "O sistema imunológico do amor"). Quando homens e mulheres têm a impressão de que seus parceiros se esforçam ativamente para aliviar sua carga, os dois vivem decididamente melhor.
Quando a criança caçula chega à puberdade, ocorre outra grande ameaça de separação, talvez porque o relacionamento tenha cumprido sua função biológica da reprodução. Ou porque depois de uma missão educacional quase cumprida a pressão social para que o casal fique unido diminuia consideravelmente.
Casais que se separam nos primeiros anos, muitas vezes o fazem em meio a brigas e amarguras; as separações que ocorrem mais tarde na vida são diferentes. Mais silenciosas. Mais resignadas. Em relacionamentos que funcionam bem, os sentimentos de amor e solidariedade crescem cada vez mais. E isso traz uma recompensa: parceiros felizes durante muito tempo ganham uma espécie de "bônus do amor": de acordo com as estatísticas, eles vivem, em média, quatro anos mais que os insatisfeitos.




John Huck
"Duas pessoas idosas que se acariciam, essa deveria ser uma imagem muito natural", afirma Willy Puchner. Mas não é, pois as carícias em público pertencem apenas à juventude. Sua série Amor na Velhice mostra propositalmente casais que não se largam nem após os 70 anos
CASAIS SE CUIDAM mutuamente e se estimulam mutuamente a visitar o médico, por exemplo. Os solteiros, em comparação, muitas vezes têm um estilo de vida arriscado. Pessoas unidas em um relacionamento feliz sofrem menos de depressão, têm menos problemas com o alcoolismo, seu sistema imunológico funciona melhor. Biólogos até observaram que os cérebros de parceiros unidos em relações duradouras funcionam parcialmente em sincronia e, com isso, ajudam a regular também as funções biológicas, como a produção de hormônios, a pressão sanguínea e o sono (veja o box "Fisiologia de casais").
Entretanto, a adaptação mútua também envolve perigos: quanto mais simbiótico um casal se tornar, acredita o psicólogo social Aron, menores são as suas possibilidades de uma expansão individual futura. "Embora o outro se torne uma parte integrante de nossa própria vida, e ficaríamos tristes com a sua perda, a verdadeira satisfação regride". Ainda assim, um relacionamento bem-sucedido pode fracassar a qualquer momento. O como e o porquê são questões exploradas principalmente por geômetras emocionais, como John Gottman.
Os pesquisadores comportamentais dissecam em sincronia os rituais dos relacionamentos. Casais são observados durante décadas. Seus gestos são reiteradamente codificados; suas palavras avaliadas e computadas. O fim de um grande amor em geral já começa logo no seu início. Casais que se separam mais tarde, ou que mergulham na infelicidade, já mostram modelos de comunicação desfavoráveis nos primeiros meses do relacionamento, mas eles são ofuscados pela paixão inicial. E que modelos são esses?
John Huck
O fim de um relacionamento não significa necessariamente o fim do amor que se sente pelo ex-parceiro. A frase, muitas vezes vazia, "vamos continuar amigos" pode se tornar verdadeira como mostram as fotos de Rachel Herman. Mas elas também ilustram a montanha russa na qual os "ex" costumam se lançar posteriormente
3. O SEGREDO DA COMUNICAÇÃO
Avaliações estatísticas feitas no laboratório do amor mostram que, nos momentos em que os casais brigam, dizem as piores e mais ferinas coisas bem no meio da discussão - enquanto fazem o maior número de propostas de contemporização. A agressão e a vontade de pacificação estão intimamente entrelaçadas, como em uma diabólica mistura.
O homem grita exaltado em voz alta: "Estamos perdendo o fio da meada". Um comunicado duplo: a comoção emotiva é agressiva; a mensagem pacificadora. Em outras palavras: vamos esclarecer tudo isso. Parceiros negativos só registram a raiva: "Não grite comigo!"; os positivos sentem o desejo de reparação: "Sim, você tem razão. Onde é que paramos mesmo?".
PARCEIROS FELIZES conseguem retomar comentários construtivos após, no máximo, 4 rodadas violentas de insultos. Em casamentos medianamente bem-sucedidos, a altercação envolve 8 rodadas de gritaria e nos casais sem salvação o conflito nunca mais tem fim, porque ele só é suprimido até a próxima explosão.
Durante muito tempo, os pesquisadores de casais acreditaram que bons relacionamentos eram particularmente previsíveis, porque neles os parceiros agiam rigorosamente de acordo com a regra da reciprocidade "pagar na mesma moeda". Eles também viam nessa ligação de confiabilidade a garantia da estabilidade. Mas hoje, um dos conhecimentos fundamentais dos cientistas é que todos os relacionamentos ruins fracassam de modo muito semelhante; os bons frutificam por muitos caminhos diferentes.
Parceiros felizes são criativos. Eles vivem no estonteante ritmo de alterações entre conflitos, humor, afeição, gozação; volta e meia soltam comentários emotivos para testar ou medir o estado de ânimo do outro, e, com muita frequência, se referem a sonhos, ideias ou fantasias comuns.
Em um experimento, pesquisadores tentaram ler os pensamentos de casais enquanto eles brigavam. Cientistas da equipe de Alan Sillars, da Universidade de Montana, nos Estados Unidos, fizeram gravações em vídeo de 118 pares que discutiram, respectivamente, durante 15min sobre um assunto de sua escolha. Imediatamente depois disso, eles mostraram o filme a cada um dos parceiros separadamente e pediram que eles informassem, a cada 20s, o que sentiram, pensaram e vivenciaram em cada etapa da briga.
Os cientistas ficaram surpresos com a simplicidade e unidimensionalidade com que transcorre a maioria das polêmicas, inclusive entre casais cultos. Quase nenhum dos parceiros tentou se colocar na posição do outro, e somente uns poucos perceberam que o outro talvez quisesse dizer algo diferente do que eles entenderam. Ao todo, dizem os cientistas, a maioria só se identificou com aquele aspecto da discussão que servia aos seus próprios interesses. Analogamente, maridos e mulheres sempre avaliaram o transcorrer do debate em seu próprio favor, ou seja, cada um invariavelmente julgou a sua conduta mais construtiva que a do seu par.


John Huck


NESSAS CONDIÇÕES, o "conversar um com o outro" muitas vezes traz mais problemas que soluções, concluem os pesquisadores. Quando somos dominados por sentimentos negativos, falamos e fazemos coisas das quais nos arrependemos mais tarde. Quando a frequência de batimentos cardíacos de uma pessoa passa de 100 por minuto, ela já não consegue mais compreender o que a outra está tentando dizer, mesmo que se esforce tremendamente, isso simplesmente é impossível.E o estágio final? Este começa quando os "cavaleiros apocalípticos" despontam no horizonte. É assim que o pesquisador de casais John Gottman denomina os pecados mortais em qualquer relacionamento. Eles desencadeiam um efeito cascata em franca escalada, e a comunicação escapa a qualquer controle.E o estágio final? Este começa quando os "cavaleiros apocalípticos" despontam no horizonte. É assim que o pesquisador de casais John Gottman denomina os pecados mortais em qualquer relacionamento. Eles desencadeiam um efeito cascata em franca escalada, e a comunicação escapa a qualquer controle.Para Gottman, o termo 'crítica' significa quase exatamente o que para outros pesquisadores quer dizer imputação. Paula não diz: "Não tem gasolina no carro. Por que você não abasteceu?", mas: "Por que você nunca pensa em nada? Eu já disse mil vezes que é para você abastecer, mas é claro que isso nunca acontece".Embora a justificativa (ou apologia) seja uma reação compreensível a um ataque possivelmente injusto como esse, ainda assim não é construtiva, pois, em geral, o "sim, mas" já está embutido em qualquer resposta do gênero "Sim, eu entendo isso, mas...". Especialistas na observação de casais sabem que nessas frases pode-se eliminar tudo o que precede o "mas". O que conta é a agressão, não a compreensão. A apologia é um método certeiro para a escalada dos conflitos.O DESPREZO SURGE quando pensamentos negativos sobre o parceiro fermentam durante muito tempo e lentamente se transformam em humilhação mútua. Ele se exprime por meio do sarcasmo, do revirar dos olhos, do xingamento, o que é um veneno fatal para qualquer relação.Mas até isso pode se intensificar ainda mais: através da demonstração de poder. "Mesmo que você não goste, vou sair com minhas amigas. Você não pode fazer para me impedir". Quando a humilhação deixa de funcionar, então simplesmente se esfrega no nariz do parceiro a sua impotência, o desprezo apimentado de modo ainda mais cáustico.No fim, só existe o recuo, a retirada. Os parceiros evitam o contato visual, deixam de responder, viram as costas, praticam a automutilação, ou seja, brincam mudos com seus cabelos ou roem as unhas. E, em algum momento, emitem a pior mensagem de todas: eles simplesmente se levantam enquanto o outro fala e saem sem dizer palavra do recinto. Fim. Acabou. Terminou.Mas essa dinâmica do fracassar não pode ser vista apenas como um cenário tremendamente barulhento, com portas estalando e louças destroçadas. Muito pelo contrário: quanto mais tempo duas pessoas convivem, mais silenciosamente elas se separam, em geral, em uma recuada recíproca para a solidão a dois. Um relacionamento também pode morrer aos sussurros.Esses casais perderam a oportunidade de reparar em tempo hábil o desequilíbrio de seu amor. O que acontece quando Fred lê em voz alta alguma notícia de seu jornal para Paula, e ela não responde logo dizendo, por exemplo, que acha a história interessante? Claro, Fred fica chateado. Mas o que é preciso acontecer e quanto tempo levará até que ele esqueça essa pequena irritação?Para isso, existe uma lei que, devidamente reconhecida, é chamada de "Constante de Gottman". Para compensar um incidente negativo entre casais; como por exemplo: uma ofensa, uma briga, um pequeno descuido ou uma negligência; o outro tem que proporcionar cinco episódios positivos de grandeza mais ou menos idêntica. Só então temos a impressão de estarmos novamente "quites" com o companheiro. 5 a 1: esta, possivelmente, é a fórmula de felicidade dos bons relacionamentos.Portanto, Paula serve mais um pouco de café para Fred, faz duas observações agradáveis sobre a noite anterior, e ri uma ou duas vezes sobre histórias engraçadas que ele conta. Depois disso, para ele está tudo resolvido.

REPRESENTANTES DA "Teoria do Investimento no Amor", como John Gottman, ou a psicóloga Caryl Rusbult, acham que toda pessoa mantém, inconscientemente, uma espécie de conta corrente sobre seu relacionamento a dois. Algo como: o que o relacionamento me traz de bom, e o que preciso investir nele para isso?Nesse diagnóstico custo-benefício, sempre comparamos nosso relacionamento atual com experiências amorosas passadas. Como no início do namoro, avaliamos o quanto pensamos ser atraentes para novos parceiros, analisamos quais alternativas poderíamos ter e colocamos na balança possíveis obstáculos para uma separação, por exemplo, uma propriedade conjunta, filhos ou o valor de uma história de vida em comum. A pergunta decisiva é: qual é o resultado da conta?Quando tenho constantemente a impressão de precisar "pagar mais" do que recebo de volta, segue-se uma bancarrota da relação. Ou então, eu procuro outras "fontes de renda": nesse caso, a emoção fora do relacionamento, ou seja, em um "caso" extraconjugal.O fato de toda pessoa ser um contador dos próprios relacionamentos é considerado muito bem consubstanciado. Mas há pesquisadores que acreditam que não podemos proceder apenas de modo calculista. Nenhum ser humano é perfeito e nenhum relacionamento resistiria muito tempo ao olhar frio de um racionalista do amor. Também já está empiricamente provado que parceiros felizes não exigem esse rigoroso exame mútuo.Afinal, conforme os psicólogos Sandra Murray e John Holmes mostraram em um influente estudo, todos os apaixonados têm de responder cedo ou tarde a uma pergunta decisiva: "Como vou aceitar que meu parceiro é tudo, menos perfeito?"Os cientistas dizem que encontrar uma boa resposta para isso é um dos maiores desafios. Os autores do estudo investigaram como casais felizes conseguem vencer esse problema: por meio do embelezamento, da maquiagem da imperfeição. Eles "constroem histórias positivas a respeito do parceiro para mitigarem suas dúvidas e reforçarem sua afeição".


John Huck
Alec Soth fotografou símbolos do amor em Niagara Falls (estado de Nova York), a capital americana das luas de mel, entre seus motivos, essas toalhas romanticamente dobradas em formas de cisnes sobre a cama de um motel

TODO RELACIONAMENTO necessita de "ilusões positivas", confirma a psicóloga de casais Susan Campbell. Mas nos relacionamentos não é a "realidade objetiva" que importa e sim a avaliação subjetiva. Segundo Campbell, o termo 'ilusão' significa 'a vontade de enxergar a relação na melhor luz possível'. Isso também garantiria uma espécie de imunoproteção amorosa contra "pular a cerca": comparativamente, parceiros alternativos não pareceriam particularmente atraentes.
Mas se é possível aprender esses modelos de pensamento é uma questão altamente controvertida. Alguns cientistas os consideram consequências de características imutáveis da personalidade; outros, como Susan Campbell, acreditam que até certo ponto é possível uma pessoa decidir-se pelo positivismo. Mas como? É possível aprender a felicidade conjugal?
4. O PROGRAMA DA FELICIDADE
Terapeutas obtêm cerca de 50% de sucesso em suas tentativas de transmitir aos casais a lógica do amor. Na forma de tratamento mais eficiente, a da terapia comportamental, cerca de 50% dos casais afirmam, após dois anos, que seu relacionamento melhorou.
Numerosos métodos de treinamento que abordam a comunicação entre casais provaram sua eficiência. Parceiros aprendem a dizer "eu", em vez de alguma outra forma vaga de expressão; eles discutem situações concretas, treinam escutar e responder ao outro o que entenderam; e recebem lições de casa, por exemplo, prestar atenção a situações positivas e se esforçar para criar pequenos momentos de atenção.
Entretanto, tudo indica que quanto mais distante fica a terapia, mais os progressos diminuem, embora ainda não existam estudos de longo prazo contundentes sobre isso. No aconselhamento matrimonial, menos intensivo, os resultados são mais modestos: apenas 25% dos pacientes admitem uma vida conjugal temporariamente melhor.
TERAPIAS MUITAS VEZES fracassam porque já é tarde demais para elas. Parceiros que buscam a ajuda de um especialista frequentemente estão tão empedernidos que não conseguem mais se desvencilhar de seus modelos de comportamentos destrutivos. De todo modo, 90% dos casais que vão ao terapeuta reclamam de sérios problemas de comunicação: "Simplesmente não nos entendemos".
Mas outra coisa, muito mais básica, dificulta as terapias: a complexidade da felicidade. Nem casais que fazem tudo certo desfrutam de uma garantia de satisfação. É recomendável evitar comportamentos ruinosos e banir pensamentos negativos, mas isso é insuficiente. É preciso acrescentar uma visão de relacionamento particular, para a qual nenhum pesquisador é capaz de fornecer uma diretriz.
Crítica e desprezo atingem as pessoas por igual. Mas o que deixa alguém feliz escapa a qualquer lógica e, por isso, esse sentimento também difere em todos os relacionamentos felizes.
Dizem os cientistas que é justamente nessa singularidade que reside a qualidade de uma boa parceria. "Não basta quando uma relação é apenas 'ok' ", diz Art Aron. "Para nossa satisfação, precisamos constantemente de novas possibilidades de desenvolvimento".
Com isso, Aron quer dizer, principalmente, experimentar coisas novas, completar-se mutuamente. Pessoas recém- apaixonadas encontram no parceiro qualidades que elas mesmas não têm e, por isso, sentem-se enriquecidas, no entanto com o passar do tempo, esses sentimentos enfraquecem. Então seria problemático procurar isoladamente uma expansão desse tipo, e ver o relacionamento apenas como um "ponto de apoio" seguro.
Assim, a recomendação de Aron é "autoexpansão em uma equipe de dois"; uma sugestão que testou em 60 casais. De início, todos os participantes tinham que avaliar uma lista de 300 atividades para casais. O que é agradável, interessante, desafiador? Em seguida, Aron lhes prescreveu que compartilhassem semanalmente um programa de uma hora e meia juntos: um cinema, uma ópera, uma corrida de carros, jantar fora, andar de mountain bike, escalar uma montanha.
Metade dos casais só tinha novidades e coisas empolgantes na agenda. Os outros faziam alguns programas que, embora fossem agradáveis, não eram incomuns em sua vida a dois. Após 10 semanas, todos deveriam avaliar o nível de satisfação de seus relacionamentos.
Para aqueles que se ativeram às atividades conhecidas e corriqueiras, o estado do ânimo havia caído ligeiramente. Para os outros, a satisfação dos dois parceiros aumentou significativamente. Segundo Aron, isso se deveu ao "novo, ao desafio, à excitação". "Essa é a chave".
Para fazê-los sentir o que "autoexpansão" pode significar, Aron amarrou casais pelos pés e pelas mãos e os mandou correr por uma pista de obstáculos em um ginásio de esportes: a dois, contra o relógio. Mesmo depois de as amarras serem soltas, os parceiros se sentiram muito mais próximos que poucas horas antes. Em contrapartida, a situação emotiva permaneceu inalterada quando eles só atravessaram o ginásio caminhando normalmente. "Parceiros precisam regularmente de desafios em comum", explica o psicólogo social. Mas ninguém ainda pode afirmar, neste momento, se é de fato nisso que reside o segredo decisivo do amor duradouro.
Essa incerteza tem dois motivos. Um é que casais duradouros constituem um fenômeno histórico completamente novo, devido à expectativa de vida, há duas gerações ainda era improvável que uma relação durasse tanto tempo.
O outro é que a longevidade dificulta a observação científica: as relações simplesmente duram muito mais que qualquer carreira de pesquisador.




O SISTEMA IMUNOLÓGICO DO AMOR

As forças de atração que tornam casais resistentes a crises e separações legais constituem um mecanismo complexo. Um estudo abrangente deve investigar o que nos une

Há alguns anos, psicólogos e sociólogos ainda se ocupavam quase exclusivamente com os pontos de ruptura de um relacionamento. Os terapeutas procuravam detectar as fraquezas, os riscos e déficits, o casal era o paciente. Agora, eles focalizam precisamente a perspectiva oposta. A grande pergunta é: como pode ser que apesar dos múltiplos problemas e desafios permanecemos unidos? O que faz com que vençamos, juntos, os obstáculos do cotidiano e os golpes do destino?
O amor dispõe de um sistema imunológico. O estudo em longo prazo Pairfam, que vem sendo realizado na Alemanha desde 2008, visa descobrir como ele funciona, e a que reage. Durante 14 anos, 12.402 pessoas, selecionadas aleatoriamente, serão regularmente questionadas sobre o estado de saúde de suas relações.
A palavra-chave para uma união à prova de crises é "resiliência". Esse conceito vale para todos aqueles fatores que fortalecem um casamento e que agem contra as forças centrífugas do cotidiano. A ciência ainda é incapaz de apresentar uma fórmula da felicidade, mas já existem resultados interessantes de estudos que precederam o Parfaim:
Quanto mais parecidos os parceiros, mais feliz o relacionamento. O equilíbrio na distribuição das tarefas domésticas também é um fator de resiliência: quando os homens limpam e cozinham com mais frequência, os casais em geral são mais felizes em sua vida a dois.
O compartilhamento do tempo de lazer, particularmente no caso de casais com filhos, também protege a união, quanto mais os parceiros ficarem juntos nessas horas, apesar das crianças, melhor sua relação. "Conectividade" significa, simplesmente, fazer algo junto com outra pessoa. O amor é uma atividade. Independentemente de quão impressionante seja a lista dos meios que fortalecem a imunologia da convivência, em geral não se sabe como e porquê eles ajudam. Primeiramente é preciso determinar o que é causa e o que é efeito. Por exemplo: os casados são mais gordos que os solteiros. Mas será que as pessoas engordam após o casamento? Ou os gordos se casam com mais frequência que os magros? (A primeira opção é a correta).
Alguns clichês colidirão com as estatísticas. Para todos aqueles que consideram o sexo um remédio todo-poderoso, os dados disponíveis são bastante desalentadores: de acordo com os números, a satisfação sexual e o contentamento geral em uma relação só dependem de cerca de 20% um do outro. Consequentemente, 80% dos "fatores de satisfação" de um casal encontram-se fora do quarto.
Na opinião de muitos pesquisadores, o segredo central da resiliência de casais chama-se perdão, mais precisamente, a disposição de desculpar. Mas isso não se refere a perdoar e esquecer frivolamente; trata-se muito mais de uma expurgação pessoal de sentimentos negativos que se acumularam no decorrer dos anos. Quanto mais íntimo o envolvimento, maiores as chances de duas pessoas sofrerem decepções. E estas muitas vezes se transformam em "contas correntes" abertas e escancaradas. Poderíamos dizer que são "notas promissórias do amor". No fundo, perdão significa, simplesmente, perdoar a dívida ao outro definitivamente.
Mas a pré-condição mais importante para uma união duradoura provavelmente é a ciência de que o amor jamais pode ser ideal, essa certeza é como uma vacina que protege o amor contra aquelas infecções de desapontamentos que atingem todos os casais, como uma gripe. Inclusive aqueles cuja mais intensa felicidade amorosa inicial parece ter saído de um conto de fadas.




FISIOLOGIA DE CASAIS: IGUAL MAIS IGUAL... FICA CADA VEZ MAIS IGUAL
Flora intestinal, ritmo do sono, traços faciais. Novas descobertas confirmam: quando duas pessoas se amam, suas características físicas também se aproximam. Frequentemente, isso é muito útil. Mas também pode provocar danos

Quem se une também se adapta intimamente. Não só no plano emocional, mas também no físico os amantes, com o passar dos anos, se adequam mutuamente. Esse processo vai tão longe, que a troca regular de fluidos corporais pode até salvar vidas. Quando um dos parceiros doa um rim ao outro, por exemplo, o sistema imunológico do receptor frequentemente reage com menos força ao novo órgão do que ao de uma pessoa completamente desconhecida.
De acordo com o perito em transplantes alemão Alfred Königsrainer, isso se deve a uma espécie de "efeito de habituação". "Os corpos trocam continuamente albuminas por meio da saliva e do esperma. Isso age de um modo semelhante ao dos tratamentos de dessensibilização em alergias: quando uma pessoa é constantemente exposta a uma pequena dose de uma substância estranha, com o tempo ela desenvolve uma tolerância a ela".
Isso também foi observado por urologistas que tratam uma "cistite da lua de mel" em mulheres recém-apaixonadas. Esta é a denominação frequente de inflamações da bexiga que se manifestam nos primeiros meses de um relacionamento, quando, no ato sexual, bactérias do corpo de um parceiro novo chegam até esse órgão. Frequentemente, o corpo reage a esses micróbios com inflamações, pois as cepas lhe são estranhas, pois a população microbiótica de um ser humano é tão única como uma impressão digital. Com o tempo, porém, a flora bacteriana de duas pessoas apaixonadas se adapta e os "incômodos da lua de mel" cessam.
Nos beijos também os co-habitantes trocam de hospedeiro. Em um mililitro de saliva encontram-se até um bilhão de criaturas vivas, ao lado de bactérias, também leveduras, amebas e flagelados. Entre casais, o índice de transmissão da bactéria periodontal Actinobacillus actinomycetemcomitans, por exemplo, está em torno de 36%. Por isso, apesar de todo o amor, seria melhor desistir da escova dental em comum, para não massagear essa bactéria indesejada nas mucosas.
Entretanto, nem todos os agentes bacterianos trocados por um casal são necessariamente perigosos. A informação é do patologista Michael Vieth, que cita como exemplo a Helicobacter pylori, uma bactéria que se aninha na mucosa estomacal, produzindo durante décadas substâncias nocivas que podem, por exemplo, provocar tumores estomacais. Embora seja transmitida por beijos, essa bactéria não pode causar muitos estragos em adultos. "A infecção geralmente ocorre na infância", explica Vieth. "Quando o sistema imunológico está maduro, ela dificilmente se instala". Mas o fato é que, nos casais, incontáveis problemas surgem duplicados. Se um parceiro sofre de úlcera estomacal, a probabilidade de que o outro também venha a sofrer da mesma doença é duas vezes maior. Em casos de asma, o perigo de "contágio" aumenta em 69%; na depressão, o dobro disso.
Exames médicos, no entanto, indicam: os dois parceiros já tinham uma predisposição para muitas dessas doenças antes do casamento, e pessoas acometidas pelos mesmos males simplesmente se unem com mais frequência. Vícios comuns, como fumar ou só beliscar a comida, e virtudes, como praticar esportes, simplesmente induzem de antemão a perfis de risco semelhantes. Portanto, a base para um sofrimento compartilhado frequentemente já é estabelecida na própria escolha do parceiro.
Exames médicos, no entanto, indicam: os dois parceiros já tinham uma predisposição para muitas dessas doenças antes do casamento, e pessoas acometidas pelos mesmos males simplesmente se unem com mais frequência. Vícios comuns, como fumar ou só beliscar a comida, e virtudes, como praticar esportes, simplesmente induzem de antemão a perfis de risco semelhantes. Portanto, a base para um sofrimento compartilhado frequentemente já é estabelecida na própria escolha do parceiro.
Na intimidade, essa aproximação pode ir além do simples contato físico. Nos primeiros anos de uma relação, o ritmo de sono de duas pessoas pode se assimilar. "Em geral, esse compasso é ditado pela parte dominante da união", afirma o pesquisador do sono Jürgen Zulley. Então uma pessoa tímida, que dorme mal, deveria se unir a outra que dorme bem e é forte? "Isso pode ajudar", concorda Jürgen Zulley.
Mas também pode ser prejudicial. Com o tempo, o ajustamento do ritmo do sono tende a se tornar novamente mais fraco. O comportamento individual de sono, geneticamente enraizado no indivíduo, volta a se impor e, nesse caso, ter um dorminhoco que ronca ao lado pode ser bastante irritante.



A VIDA A DOIS EM NÚMEROS
Uma comparação entre idade matrimonial, índices de divórcios e a cota de solteiros

O sonho de ter um relacionamento feliz é cultivado no mundo inteiro. Em 25 nações industrializadas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cada segundo cidadão casa-se pelo menos uma vez na vida. Em que idade isso ocorre, porém, é uma variável regional. Na Europa, os escandinavos são os que mais hesitam em percorrer o caminho até o cartório. As suecas casam-se, em média, aos 30 anos e os homens com 32,5. Os habitantes da Europa central e do sul casam-se numa faixa etária intermediária, enquanto no Leste Europeu os casais se unem mais cedo, respectivamente aos 24 e 26 anos. Mas em todos os casais dos países da OCDE pesquisados as mulheres são de 2 a 3 anos mais jovens que os homens.
Em outras regiões do mundo, muitas vezes as meninas se casam antes de se tornarem mulheres, e, frequentemente, contra a vontade. No Afeganistão, por exemplo, mais da metade das noivas tem menos de 16 anos. E em alguns países muçulmanos as garotas são dadas em casamento mais jovens ainda.
Também existem grandes diferenças na decisão de se separar novamente, embora os índices de divórcios venham aumentando constantemente desde os anos 70 em todo o mundo. Do ponto de vista estatístico, no Peru os casais parecem manter a maior fidelidade: ali, o índice de divórcios é de 0,1 para cada 1.000 habitantes. Em outros países acentuadamente Católicos esse número também é muito baixo, por exemplo, na Itália e na Irlanda (0,8). A recordista mundial de divórcios é a ilha de Guam, no Pacífico, com 11,9 por 1.000 habitantes; seguida por Botsuana, na África, com 6,9 por 1.000. Em alguns países islâmicos, o número de divórcios tem aumentado. Na Turquia, por exemplo, eles quadruplicaram desde a década de 1970, saltando de 0,3 para 1,3 por 1.000 habitantes. O mesmo ocorre no Irã, nessa teocracia, influências ocidentais e uma renovada autoconfiança estão levando cada vez mais mulheres a exigir o divórcio.
Até na China, onde um casamento fracassado foi considerado durante muito tempo como uma mácula indelével, o número de divórcios anuais disparou de 285.000, em 1978, para 1,89 milhões em 2006; portanto, para 1,5 por 1.000 habitantes. Desde 2003, ali também é possível separar-se consensualmente em uma questão de horas, por uma taxa equivalente a 1 euro (R$ 2,30). Mas essa opção também parece estar encorajando novas uniões: após uma breve regressão, o número de casamentos aumentou 13% de 2005 para 2006.
Quanto ao tempo médio de duração de um casamento antes de uma separação, pouca coisa mudou em grande parte do mundo entre 1980 e 2005: em comparação com os países da OCDE, são os casais americanos que mais cedo decidem trilhar caminhos isolados: após 8 anos em média. Os suíços, noruegueses e belgas são os mais tenazes (quase 13 anos), seguidos de perto pelos holandeses, islandeses, australianos e portugueses.
Outra forma de vida, ignorada durante muito tempo, vem sendo registrada por estatísticos há alguns anos, pelo menos nos países industrializados: os solteiros. Sem grandes surpresas, os dados mostram que a maior parcela de pessoas sós se encontra em países liberais da OCDE, como a Noruega (19,3%), a França (22,8%) e a Dinamarca (24,1%). Em países onde a família tradicional e a religião desempenham um papel relevante, uma pequena parte da população vive oficialmente só (na Turquia 3,9%, em Portugal 7,0% e na Romênia 7,6%).



fonteGEO:















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