quinta-feira, 21 de julho de 2011

70 anos de "Cidadão Kane" no Brasil

70 anos de "Cidadão Kane" no Brasil MARCELO MIRANDA



Para François Truffaut, "Cidadão Kane" foi um filme que resume todos os feitos anteriormente e antecipa todos que viriam posteriormente. O crítico André Bazin escreveu que Welles "trouxe (ao cinema) uma contribuição poderosa e original, que, queira-se ou não, abalou o edifício das tradições cinematográficas". Rogério Sganzerla definiu o longa como "o primeiro filme baseado em princípios relativistas de captação do universo e de um personagem".

Há exatamente 70 anos, estreava no Brasil aquele que ainda hoje encabeça listas e mais listas de melhor ou, no mínimo, como o mais importante filme de toda a história do cinema. Nada em referência a "Cidadão Kane" costuma ser muito menos que isso. A ideia vale não só para relembrá-lo décadas depois, mas especialmente sobre sua própria feitura. "Em Orson Welles, como em William Blake, a beleza é a exuberância", decretou Sganzerla, em artigo publicado no "Estado de S. Paulo" em 1965. "Exuberância técnica, acúmulo de personagens, de intenções históricas, histriônicas, de montagem, exuberância do mau gosto e, enfim, a exuberância do cinema americano".

Welles tinha apenas 26 anos quando "Cidadão Kane" foi exibido pela primeira vez nos EUA, em maio de 1941. Diferente de boa parte dos filmes expressivos que ganham reconhecimento apenas muitos anos depois de lançados, de cara o diretor foi saudado como gênio precoce. Esta foi, certamente, sua glória e sua maldição.

"Cidadão Kane" dominou as discussões cinematográficas daquela época. Não apenas por ser recebido como um autêntico sopro estético na forma de narrar e desenvolver um enredo aparentemente banal, mas por polemizar em cima da figura do magnata da mídia William Randolph Hearst. O dono de um conglomerado de comunicações processou Welles por acreditar que o personagem Kane era inspirado em fatos nada meritórios de sua vida.

Arrogante e vaidoso, Welles se deixou levar pela fama instantânea. Gerou antipatia de várias frentes, especialmente dos estúdios. Ao rodar seu segundo filme, "Soberba", teve a surpresa de ver a RKO picotar o trabalho e remontá-lo à sua revelia.
TRAJETÓRIA
Obra é das mais fortes feitas nos EUA

Em cena. Orson Welles como o personagem-título de "Cidadão Kane", que ele dirigiu e produziu

Após o ocaso de "Soberba" em 1942, Orson Welles jamais conseguiu a mesma liberdade que teve para realizar "Cidadão Kane". Ele mesmo dizia ter sido o verdadeiro dono de um filme apenas com "Kane" e, depois, "Otelo" (1952) e "Dom Quixote", este nunca tendo sido finalizado.

Mesmo assim, filmes como "A Marca da Maldade", "O Processo" e "A Dama de Shangai", em especial, formam, com "Cidadão Kane" e "Soberba", uma das mais consistentes e fortes obras do cinema feito nos EUA, fosse Welles ou não o artífice final. Mesmo infeliz, ele fez história. (MM)

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