segunda-feira, 29 de novembro de 2010

era uma vez...

Vai haver um dia, quando já nada restar, que a fidelidade será ensinada nos bancos da escola. Os professores exibirão nos seus quadros electrónicos gravuras antigas, que demonstram cabalmente que ela terá existido em tempos idos e todas as crianças exclamarão com espanto como se estivessem a ver uma cidade perdida, entretanto submersa.

A fidelidade está a perder-se como estas cidades: sabemos que existe, mas dificilmente a veremos. A fidelidade passou de moda. Vai-se aos desfiles de Paris e de Nova Yorque e ninguém a veste. A fidelidade tem uma cor ultrapassada e gasta, de meias grossas, agora só encontrada em calendários baços dos anos antigos. A fidelidade é passado. O futuro é dos polígamos e dos polígrafos. Dos polígamos, porque são eles que representam o pulsar exacto destes dias. Dos polígrafos, porque serão agora mais usados para percebermos como mente o presente. Por isso, detesto tanto o presente, de tal forma que o nego.



Por mim, gostaria de viver sempre no passado ou no futuro, mas nunca hoje, sempre amanhã ou ontem. E isso até poderia ser possível, não tivessem os fundamentalistas do presente inquinado todos os saudosistas e os futuristas. Reparem que não existem presentistas, do mesmo modo que não existe presentismo. E por quê? Porque o presente não existe. Não tenham dúvidas, todos somos já passado ou futuro de algo. O presente, foi algo que inventaram quando alguém foi à água. E é este presente inventado, este presente que não existe, que deixou de ter fidelidade a tudo: à praia, ao corte de cabelo que deveria ser sempre assim, às bolas de Berlim que só comeríamos no senhor Victor, ao segredo que nos haviam dito para guardarmos, à pessoa que jurámos amor para sempre, ao clube, ao nosso irmão de sangue, que nos telefonou quando mais precisávamos, a este jornal, a estas linhas, ao homem, à mulher que todos os dias se deita connosco. Que se lixe este presente, eu só quero futuro e passado, onde a fidelidade me dá tesão.

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