domingo, 24 de outubro de 2010

*Da arte de sedução*


Quando uma mulher diz “ele é um homem interessante”, ela está a menos de um passo de se apaixonar, mesmo que não saiba. O filósofo espanhol Ortega y Gasset diz que “você é um homem interessante” é o que de melhor um homem pode ouvir de uma mulher.                           O homem que escuta isso com alguma freqüência pode tranquilamente optar por ser um Don Juan. 
O homem pode ser até meio feio, isso não importa para a mulher.                                      Mesmo que uma mulher goste de ter homens bonitos, o não belo – mas interessante – é que irá livrá-la do tédio e arrancar dela os seus melhores momentos, talvez uma vida. O amor de uma mulher, o amor do enamoramento, só é verdadeiramente cedido a quem ela diz que “é interessante”. 
Ortega y Gasset gasta tinta tentando definir o que é um “homem interessante”. Mas ele acaba se desviando e, ao fim e ao cabo, não consegue circunscrever algo para oferecer ao leitor. Mas ele sabe que está certo. E está mesmo.  Todavia, por todo o sempre só a mulher que diz “você é um homem interessante” pode realmente definir o que é tal coisa. Mas não adianta
perguntar – ela não dirá. A maioria jamais conseguirá ir além da própria frase. “Um homem interessante” é uma expressão que tem tudo para ser um produto intelectual e assim se parece, mas vem do interior do baixo ventre feminino e passa por todos os canais do coração. É uma frase literal, mas soa melhor que as melhores metáforas da poesia. 
Interessante: o que é objeto do interesse. O que é objeto do interesse: aquilo que me prende a atenção. Gasset também fala do enamoramento como algo do âmbito da atenção e da observação. Não há dúvida. Uma mulher diz ao “homem interessante”, ao declarar isso, que ele é o foco das atenções, que ela gosta de observá-lo, em todos os sentidos. Ele, “o homem interessante”, diz “o que uma mulher quer ouvir”. Ele é proprietário de elogios que deleitam a mulher e de produção de pequenos enigmas que instigam toda a psicologia feminina (e isto já é por minha conta, nada tem a ver com Gasset). 
Ser um homem interessante é ser capaz de dizer à mulher tudo que ela quer ouvir. Mas, enfim, o que ela quer ouvir? Ela não quer só elogios. Ela quer, antes de tudo, alimento à sua psicologia. A mulher quer pistas para ela própria descobrir quem é a partir do outro. Nada torna uma mulher mais atenta que funcionar como o seu oráculo particular. Dê uma mulher boas pistas para que ela possa investigar a si mesma e ter um auto-retrato de suas melhores qualidades, porém com pitadas de maldade, e você será um “homem interessante”, caso você realmente seja um homem interessante. Essa fórmula não falha, embora ela seja circular: você precisa já ser interessante para ser interessante com tal dispositivo. 
Um “homem interessante” provoca a imaginação da mulher a respeito não dele, mas dela.    Ela começa a encontrar em si muito do que gostaria de achar, mas que só pode vislumbrar a partir das trilhas que vem do alerta do “homem interessante”. A fala do “homem interessante” convida a mulher a uma hermenêutica de si mesma. O que ela faz e falam que a torna quem ela é – uma mulher capaz provocar algum encanto. Qual o encanto? O encanto de se encantar com o “homem interessante”. O “homem interessante”, ao tornar-se um Don Juan, é um tremendo altruísta que circunda o mais profundo amor voltado para si mesmo. Ele quer a realização da mulher. Mas, se ele é o “homem interessante”, ele sabe perfeitamente que ela é que irá proporcionar o maior prazer, que é o prazer que ele mesmo pode tirar do mundo. Só ele, bem mais que ela, é quem sabe do mundo, de como o mundo está para nós como objeto de produção de satisfação. 
© 2010 Paulo Ghiraldelli Jr., filósofo, escritor e professor da UFRRJ.
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